Publicado em: 20/10/2021
Um mundo de composições
Por Celso Mojola
Em setembro completei 40 anos de atividades artísticas e revisando meu catálogo de obras percebi que compus mais de 100 peças. Achei curiosa essa constatação e passei a refletir sobre isso.
Fico feliz por ter alcançado tantos anos de dedicação exclusiva à música. Esse longo tempo permitiu aprofundar meu conhecimento, trilhar um caminho voltado ao ensino e acompanhar o desenvolvimento de vários músicos que iniciaram seus estudos especializados comigo e hoje se destacam como líderes na composição, na regência, na performance instrumental e vocal e na docência. Minha formação pessoal, da alfabetização ao doutorado, ocorreu em escolas públicas, e minha carreira como professor realizou-se inteiramente em instituições privadas. Tenho uma visão realista das qualidades e problemas dos dois sistemas, e procuro aproveitar o que cada um traz de melhor. Meus rendimentos vêm dos meus alunos, e tenho muito respeito por eles.
Algumas ideias se penduraram no trapézio do meu cérebro quando comecei a pensar sobre o tamanho de minha produção artística. Em meu solilóquio considerei-a bastante significativa, uma vez que não sou um compositor de extraordinária fluidez: planejo e reviso muito, o que consome tempo e exige esforço intelectual. 100 composições tornam-se um marco ainda mais relevante se considerarmos que ninguém quer ouvir minha música...
Na verdade, essa última afirmação não é inteiramente correta, ainda que traduza um sentimento justificado. Felizmente ao longo desses 40 anos tenho recebido uma boa apreciação, e há pessoas que me acompanham há muito tempo e seguem incentivando minha carreira. Desenvolvi projetos em associação com músicos, entidades culturais, instituições de ensino e orquestras que foram maravilhosos e trouxeram projeção e reconhecimento. Mas também é verdade que há por aí um imenso espaço de indiferença e desinteresse, que parece aumentar a cada dia. Não dá para negar que insistir tanto tempo nessa área é por si mesmo um teste de resistência.
Observando retrospectivamente percebo que nunca fiquei um longo período sem compor. Acho importante compor regularmente, pois essa atividade, tal qual a performance, necessita de continuidade. Há períodos em que me dedico mais intensamente, mas nunca estive longe do lápis e da partitura por mais de um ano. A década de 1990 mostra uma predominância de música orquestral, já o início do século XXI foi intensamente dedicado à música de câmara. Os últimos anos tem sido o momento do piano.
Muita coisa mudou ao longo dessas quatro décadas de trabalho: mudou a sociedade e mudei eu. Produções que achava ótimas há alguns anos, hoje não fazem mais sentido; por outro lado, coisas antes absurdas atualmente são normais. Relevante em tudo isso é que sigo tendo cada vez mais ideias e projetos.
A pandemia gerou rápidas mudanças e trouxe muitas perdas pessoais. Em dois anos vivi experiências que normalmente ocorreriam em dez, o que afetou minha maneira de apreciar, pensar e produzir arte. Isso certamente estará espelhado na minha poética daqui para frente. O que pretendo compor em breve? Um quarteto de cordas, um trio com piano e uma ópera estão no radar.
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